
É sábado. Ela atravessa a balsa para chegar à longa avenida que leva à praia da cidade ao lado. Tem esperança de encontrar o rapaz moreno e distraído que havia visto nos corredores da faculdade. Sabe que reside ali e, por sorte, talvez o encontre nesta tarde de sol forte.
E de repente lá está ele, em cima de uma bicicleta tão velha que range a cada pedalada. A camiseta, o calção e as sandálias esportivas em nada combinam com o perfil sisudo das noites de aulas.
Ele a vê e sorri. Caminham ao lado do ruído irritante da mola solta do selim e chegam ao mar. A brisa os leva até as pedras à sombra do antigo farol. Ali sentam, conversam e se conhecem mais. Quase ao pôr do sol a leva até a travessia da balsa e se despede. Apenas palavras, sorrisos e olhares cautelosos, sem toques.
Os dias seguem inquietos. Tempos depois combinam um barzinho e ele a convida para uma nova travessia na balsa, logo após ao beijo em frente ao portão.
A casa de rapaz solteiro é intrigante. Fez limpeza e preparou o jantar para impressioná-la. As sandálias descoladas aguardam ao lado de dentro da porta. Ele pega na mão dela e faz carinho em seu rosto. Dançam, beijam-se e aquela noite quente de verão dá início aos próximos dez anos juntos. É paixão, amor e complemento.
Mas, algo não é para ser. Um dia, assim do nada, aquela travessia a trouxe de volta sem disfarçar as lágrimas de despedida. E a vida seguiu nas idas e vindas cinzas do navegar da balsa. Com o decorrer do tempo aquela travessia não mais doía no peito. Voltou a ser o que era antes dele. Um balançar de ondas em sorridentes tardes de verão.
(Para um grande amor de antes. Domingo, 29/05/2022, 18h, Rio do Sul/SC)
