Quando a solidão da leitura promove encontros

Ler um ato solitário. E isso muito me encanta na relação íntima que se cria com os personagens da ficção. Mas ler é também um ato solidário quando pessoas se encontram para compartilhar os sentidos de uma história. Essa é justamente a proposta do Clube de Leitura que está sendo criado em Rio do Sul.

Até agora foram dois encontros do projeto idealizado pela Associação de Escritores do Alto Vale do Itajaí. A cada dois meses, leitores se reúnem para conversar sobre o enredo, personagens e detalhes de história ficcionais. Dividem ideias e interpretações sobre um conto, novela ou romance. A primeira edição colocou na mesa de discussão o conto O homem que sabia javanês, de Lima Barreto. A segunda foi com um clássico, a “novela perfeita”, como escreveu o crítico e professor Paulo Rónai: A morte de Ivan Ilitch, de Lev Tolstói. A primeira dedução coletiva foi que a obra acaba com a possibilidade do mais grave dos spoilers já no título. Só que a conversa foi bem além disso porque o livro trata mesmo é da vida do juiz de instrução russo. Os poucos, mas bons participantes do clube, descobriram juntos alguns detalhes elementares da história, debateram sobre quem era e o que queria afinal Ivan Ilitch, um homem com uma vida comum, mas que nas mãos de Tolstói se transforma em algo extraordinário.

Foto: Jonas Felácio Junior

As obras escolhidas para o clube são definidas em grupo. A cada encontro se elege o livro para a edição seguinte. A terceira edição foi sobre o romance As fantasias eletivas, de Carlos Henrique Schroeder, que é natural de Trombudo Central. Essa é justamente uma proposta do clube, promover a literatura produzida em Santa Catarina. Por isso é que o clube se organiza num ciclo com obras de autores estrangeiros, de autores nacionais e, entre estes, algum escritor catarinense.

Carlos Schroeder é autor da coletânea de contos As certezas e as palavras (Editora da Casa, 2010, obra vencedora do Prêmio Clarice Lispector 2010, da Fundação Biblioteca Nacional), As fantasias eletivas (Record, 2014), História da chuva (Record, 2015) e Aranhas (Record, 2020). Tem contos traduzidos para o alemão, espanhol e islandês. Muitos dos enredos, personagens e cenários das histórias do autor se passam em cidades catarinenses, que funcionam como o arcabouço para a narrativa e a invenção criativa do autor.

As fantasias eletivas se passa, por exemplo, na turística Balneário Camboriú. É na cidade que Renê, um recepcionista noturno de hotel, tenta reconstruir sua vida e encontra na amizade de Copi, um travesti obcecado por fotografias, uma alternativa para sua vida destruída. Renê lerá o que Copi escreve e será o único que terá acesso a suas fotos de surpreendente beleza. É quando um livro se abre dentro do livro, e tudo se torna um grande ensaio da alma humana. É assim que a própria sinopse da obra resume As fantasias eletivas, um romance que une prosa, poesia e fotografia para refletir sobre a solidão e a criação literária, e mostra como a literatura, a de verdade, é sobretudo feita de sangue.

Para acompanhar a agenda do clube: @associacaodeescritores

Por Tiago Amado.